Wednesday 2 December 2009

Após petição virtual, Grã-Bretanha pede desculpas póstumas ao gênio gay punido com castração



O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, pediu nesta sexta-feira, 11/09, perdão pelo tratamento dado ao matemático Alan Turing – que decifrou a criptografia do código Enigma, que a Alemanha nazista usava para mandar mensagens militares durante a Segunda Guerra Mundial.

A petição virtual enviada ao premiê Gordon Brown recebeu mais de 31 mil assinaturas, ela exige que o governo britânico reabilite a memória de um dos mais importantes cientistas britânicos e se desculpe por te-lo submetido a um tratamento hormonal que acabou por leva-lo ao suicídio, aos 41 anos. “O governo britânico deveria se desculpar a Alan Turing e reconhecer que seu trabalho viabilizou em larga medida o mundo em que vivemos e nos salvou da Alemanha nazista”, diz a petição, aberta pelo programador John Graham-Cumming.

A campanha foi abraçada por nomes como o escritor Ian McEwan e o biólogo Richard Dawkins, para que Turing deveria ter sido “condecorado”. “Em vez disso, esse gênio excêntrico e delicado foi destruído por um “crime” (sic) que não prejudicou ninguém”, disse ao jornal “The Independent”.

Cumming, que é heterossexual, também sofreu discriminação. Ele recebeu comentários contrários à petição e foi até acusado de fazer parte da “ Agenda Gay” (farsa homofóbica na qual gays teriam um planejamento para dominar o mundo (rs), muito utilizado por religiosos para amendrotar seus seguidores).

O próprio Cumming não acreditava no seu sucesso da petição virtual. “Eles (o governo) estariam ferrados, pois precisariam se desculpar com todos os homens que foram processados por indecência e lidar com um a lista de coisas desagradáveis que as pessoas poderiam exigir”, escreveu Cumming no seu blog.

No seu blog, ele também escreveu sobre a surpresa ao retornar uma ligação telefônica perdida, já que ele se encontrava enfermo por consequência de uma gripe, para o gabinete do primeiro-ministro. “Olá John. Aqui é o Gordon Brown. Acho que você sabe o motivo da minha ligação para ti.” falou o premiê ao atende-lo. Brown agradeceu ao Cumming pela iniciativa da campanha, falou do fato do governo ter deixado tanto tempo a injustiça contra Turing e das terríveis consequências das leis homofóbicas contra para suas vítimas (veja no final do texto a declaração do primeiro-ministro).

Uma nota curiosa é o Cumming comentando no seu blog que boa parte do trabalho do seu ativismo gay 2.0 foi realizado no segundo andar de um ônibus londrino. “Incrível o que você pode fazer com 30 minutos de paz e com um iPhone”.

A HISTÓRIA DE ALAN TURING
O matemático Alan Turing é considerado por muitos o pai da ciência da computação e da inteligência artificial. Ele provou nos anos 1930 que não havia instrumento capaz de fazer qualquer tipo de cálculo e lançou o conceito de uma máquina que conseguisse fazer esses cálculos, comandado por instruções humanas.

A história de Alan Turing foi contado na biografia “Alan Turing: o Enigma”, do matemático Andrew Hodges (1983), e no filme “Quebrando o Código” (1996).



Quando estourou a Segunda Guerra Mundial, Turing fora recrutado há um ano pelo departamento de análise criptográfico na central de comunicações do governo britânico (GCHQ, na sigla em inglês) e passou a dedicar-se integralmente a um projeto, conduzido secretamente na mansão de Bletchley Park, em Bucking-hamshire, perto de Londres.

Foi Turing que conseguiu decifrar o código da máquina de criptografia Enigma, que os nazistas usavam para mandar mensagens militares cifradas durante a guerra. Desta forma o Reino Unido passou a interceptar as mensagens e localizar os submarinos alemães, atacando-os e revertendo a virtual derrota.



Como seu trabalho era secreto, Turing não levou seu merecido crédito.

Além de decifrar o código alemão, Turing fez contribuições significativas nos campos da inteligência artificial e da ciência da computação, que ainda engatinhavam. Em 1936, ele escreveu um artigo chamado “ On Computable Numbers” e em 1950 formulou um teste para avaliar a inteligência de uma máquina. O método foi reconhecido como o “ Teste de Turing”. Ele trabalhou depois da Segunda Guerra Mundial em várias instituições de pesquisa, inclusive na Universidade de Manchester. Lá, ele operou o Manchester Mark 1, considerado um dos primeiros computadores modernos.

Em 1952, Turing foi preso por ser gay. Ser homossexual ainda era crime na Inglaterra. Foi dado a ele a opção de ficar preso ou sujeitar-se a uma castração química com estrógeno que na teoria iria neutralizar seu libido sexual por homens. Turing aceitou receber injeções mas as aplicações do hormônio sexual feminino deformou-lhe o corpo e desequilibraram seu organismo.

Humilhado publicamente, Turing perdeu o acesso de segurança aos laboratórios onde trabalhava, já que homossexuais eram alvo fácil de chantagem, de acordo com as cabeças preconceituosas do comando militar. Ele era uma brecha na Segurança Nacional.

Debilitado psicologicamente e fisicamente, Turing morre em 1954 ao comer uma maçã envenenada.

Leia o depoimento do primeiro-ministro Gordon Brown:



Primeiro-ministro Gordon Brown
2009 foi um ano de profunda reflexão – uma possibilidade para a Grã-Bretanha, como uma nação, para comemorar as dívidas profundas que temos para com aqueles que vieram antes. Uma combinação única de aniversários e eventos têm mexido em nós esse sentimento de orgulho e gratidão que caracterizam a experiência britânica. No começo desse ano eu estava com os presidentes Sarkozy e Obama para honrar o serviço e o sacrifício dos heróis que invadiram as praias da Normandia há 65 anos. E só na semana passada, que marcou os 70 anos que se passaram desde que o governo britânico declarou a sua vontade de pegar em armas contra o fascismo e declarou a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Portanto, estou contente e orgulhoso de que, graças a uma coalizão de cientistas, historiadores e ativistas LGBTs, este ano temos uma chance para marcar e comemorar mais um contributo para combater Grã-Bretanha contra as trevas da ditadura, a de “code-breaker” (quebrador de código) Alan Turing.

Turing foi um matemático muito brilhante, mais famoso por seu trabalho em quebrar os códigos alemão Enigma. Não é exagero dizer que, sem a sua notável contribuição, a história da Segunda Guerra Mundial poderia ter sido muito diferente. Ele realmente foi um daqueles indivíduos que podem apontar a contribuição cujo original ajudou a virar a maré da guerra. A dívida de gratidão que é devida a torna ainda mais horripilante, portanto, que ele foi tratado de modo cruel. Em 1952, ele foi condenado por “indecência grave” – na verdade, por ser gay. Sua sentença – e ele foi confrontado com a escolha infeliz deste ou da sua prisão – foi a castração química por uma série de injeções de hormônios femininos. Ele tirou a sua própria vida apenas dois anos mais tarde.

Milhares de pessoas se uniram para exigir justiça para Alan Turing e o reconhecimento da forma terrível que ele foi tratado. Embora Turing fosse tratado no âmbito da lei da época e não podemos colocar o relógio para trás, seu tratamento foi totalmente injusto e estou contente por ter a oportunidade de dizer o quão profundamente pesaroso que eu e todos nós para o que aconteceu com a ele. Alan e os muitos milhares de outros homossexuais que foram condenados como ele foi condenado sob as leis homofóbicas foram tratados terrivelmente. Ao longo dos milhões de anos mais viviam com medo de condenação.

Estou orgulhoso de que aqueles dias se foram e que nos últimos 12 anos, este governo tem feito muito para tornar a vida mais justa e igual para nossa comunidade LGBT. Este reconhecimento do estatuto de Alan como uma das vítimas mais famosas da Grã-Bretanha da homofobia é mais um passo rumo à igualdade e há muito esperada.

Mas, mesmo mais do que isso, Alan merece o reconhecimento por sua contribuição para a humanidade. Para aqueles que nasceram depois de 1945, em uma Europa unida, democrática e em paz, é difícil imaginar que o nosso continente foi uma vez o teatro da hora mais escura da humanidade. É difícil acreditar que na memória de vida, as pessoas poderiam se tornar tão consumidas pelo ódio – por anti-semitismo, a homofobia, a xenofobia e outros preconceitos assassinos – que as câmaras de gás e crematórios tornou-se um pedaço da paisagem europeia, tão certo como o galerias e universidades e salas de concerto que tinha marcado a civilização europeia, há centenas de anos. É graças a homens e mulheres que foram totalmente comprometida com a luta contra o fascismo, pessoas como Alan Turing, que os horrores do Holocausto e da guerra total são parte da história da Europa e não está presente na Europa.

Assim, em nome do governo britânico, e todos aqueles que vivem em liberdade graças a um trabalho de Alan Tenho muito orgulho de dizer: Desculpe-nos, você merecia muito melhor.

Gordon Brown



SOURCE by Folha de Sao Paulo, Folha Online and MàssaoUéhara

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